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Não é problema meu

Atualizado: 21 de jul. de 2018

Adriana Silva

Eu tive um professor no doutorado em Filosofia da Educação que dizia, semanalmente, “que depois que a gente sabe, a gente não pode mais não saber”. E essa é uma verdade incontestável. É nosso desejo, muitas vezes, deixar de saber algumas coisas. Mas isso não é possível. Tornamo-nos servidores do nosso conhecimento. Ele que, na mesma proporção liberta e escraviza.

Aprendi uma coisa nestasemana e não estou conseguindo deixá-la de lado. Fingir que não sei. A frase do meu professor fica ecoando eeu complemento: agora que sei, o que eu vou fazer? Enquanto penso em possibilidades práticas, escrevo para compartilhar.

Em conversa com pessoas incríveis, que dedicam parte do pouco tempo ocioso que possuem a melhorar a vida de outras pessoas, carentes de carinho, de amor e mais ainda, de perspectiva de vida, aprendi que nossa sociedade política está muito despreparada para lidar com os problemas das ruas. Na sexta-feira eles verbalizaram o que sabiam, no sábado eu os acompanhei em ação no campo, para sentir de perto.

As políticas públicas de atendimento social foram criadas para melhorar a vida das pessoas, mas antes de serem um instrumento a favor dos seres humanos que se qualificam para fazer o acolhimento de pessoas com problemas, são documentos burocráticos que organizam regras, muitas delas intransponíveis. São essas políticas que estão permitindo a prática do “não é problema meu”.

Esses doadores de vida me ensinaram que, nas ruas, as políticas públicas sociais não estão do lado dos necessitados. Ouvi deles que existe serviço para atendimento aos moradores de rua e um outro serviço para encaminhamento do usuário de droga. Mas que o comum é alguém chegar para o procedimento e ao ver que o necessitado é morador de rua, encaminhá-lo para o atendente do usuário de droga, alegando que o problema não é seu. E, logo depois, o atendente restrito ao morador de rua não agir por identificar o cidadão como usuário de droga. O mesmo se dá com o indivíduo tido como desequilibrado mental, que se refere a um outro serviço público. Mais vezes do que o desejado, vence o “não é problema meu”.

No final, o que fica, é a certeza de que estamos no caminho errado diante da necessidade de enfrentarmos os problemas da nossa sociedade. Assusta a possibilidade da aceitação em massa da prática do “não é problema meu”.

Mas então, você leitor, pode estar se perguntando, seria esse um problema meu? Sim, e agora que sei, não posso mais não saber.


Artigo originalmente publicado no jornal A Cidade - julho de 2018.


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